domingo, 18 de setembro de 2016

Uma homenagem a todos os palhaços


Nessa semana que passou, dia 15/09, ficamos todos chocados com a morte precoce do ator Domingos Montagner com apenas 54 anos e muito potencial em sua carreira. Somente o conhecia por sua atuação na TV e no cinema, mas não sabia que ele tinha iniciado sua carreira artística como palhaço. Essa imagem que vi dele como palhaço me remeteu a um tempo da minha vida muito longíquo, como em memórias enterradas muito a fundo pela erosão das próprias circunstâncias da vida.

Na minha infância o circo tinha um quê de alegria e mistério: eu ficava realmente nervosa ao ir ao circo. Via membros da plateia "virarem" cães ou macacos, via o mágico colocar sua assistente em uma caixa e espetá-la com diversas espadas, via o motociclista na esfera da morte e eu imaginava como isso acontecia, como seria possível aquilo tudo estar acontecendo. Havia também os malabaristas e eu em casa tentava repetir os movimentos com laranjas, sem sucesso. Havia os equilibristas e eu suava frio ao vê-los em uma bicicleta em cima de uma fina corda, imaginando se eles caíssem. Havia os animais incríveis: leões, elefantes e tigres, um misto de medo e admiração por aqueles bichos tão grandes. Havia um misticismo um pouco tenso no circo que me fazia ter medo de saber o que havia por detrás dos panos quando o show terminava.


E havia os palhaços: neste momento toda a minha tensão de outrora ia embora e eu podia respirar e rir. Eles eram bobos, caricatos e às vezes meio abusados. Tiravam piadinhas de gosto duvidoso com a plateia e faziam trapalhadas um tanto teatrais. Os palhaços podiam até parecer o elo mais fraco do espetáculo mas tinha um dever muito importante: colocar tudo de volta nos eixos, mesmo que fazendo tudo de maneira "errada".

Mais tarde vi outros tipos de palhaços, alguns de rua pedindo trocados no sinal com uma pintura no rosto esgarçada pelo calor do sol; outros entravam nos ônibus e pediam dinheiro para associações filantrópicas; outros animavam as crianças com câncer e os velhinhos nos asilos. Vi até palhaços tristes e ícones dos carnavais: Pierrot e Arlequim, personagens que as pessoas vestiam para saírem por algumas horas de suas vidas tão atribuladas.


Passei a ver o palhaço como mais do que um mero item acessório de um circo mas como um patrimônio social, uma verdadeira benesse à nossa caótica sociedade. Num mundo em que não paramos, não temos tempo, não descansamos e não olhamos o lado do outro, ter alguém que faz de seu objetivo de vida - o seu ganha-pão - trazer alegria aos outros, é algo muito importante e pouco reconhecido, infelizmente. E o palhaço é assim - abdica de sua própria personalidade e de seu visual e encarna um personagem que vem arrancar alguns risos de quem precisa.

Não quero me prolongar aqui e por fim deixo meu sincero agradecimento a todos os palhaços que já vi e uma homenagem sincera e simples a vocês. Daqui uns anos, quando meu filho estiver maior, vou levá-lo ao circo e falar sobre vocês enquanto pelo rabo do olho observo-o nessa dualidade de sentimentos que o picadeiro traz.




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